Saiba o que está previsto e a análise das centrais
Reforma trabalhista está longe
da unanimidade
Centrais sindicais e entidades patronais divergem até mesmo entre elas
BRASÍLIA - Apesar de governo e parlamentares defenderem que a reforma trabalhista foi fruto de um consenso entre representantes dos trabalhadores e patronais, muitos dos principais pontos do projeto de lei levantam divergências, sobretudo entre as centrais sindicais. Especificamente em relação ao fim da obrigatoriedade da contribuição sindical, incluído no texto pelo relator da matéria na Câmara dos Deputados, Rogério Marinho (PSDB/RN), não há consenso nem mesmo entre as entidades patronais. Quando se trata de temas como representatividade dos trabalhadores e termos de acordos coletivos, por exemplo, os patrões se mostram insatisfeitos com a reforma trabalhista.
O GLOBO procurou a Confederação Nacional da Indústria (CNI) e duas das maiores centrais sindicais do país, a Central Única dos Trabalhadores (CUT) e a Força Sindical, sobre sete itens da proposta: acordado sobre legislado, parcelamento de férias, demissão em comum acordo, jornada intermitente, intervalo intrajornada e a criação de um comitê representante dos trabalhadores dentro da empresa. Veja qual é a opinião dos representantes de empregados e empregadores sobre esses assuntos:
Acordado sobre legislado
O que diz o projeto de lei: Esse é o principal ponto da reforma trabalhista. Para 15 itens, o acordo entre sindicatos e empresas terá força de lei. Entre esses itens estão: jornada de trabalho (respeitando o limite de 10 horas diárias), banco de horas anual, intervalo intrajornada, plano de cargos e salários, troca de dia do feriado, teletrabalho, prorrogação de jornada em ambientes insalubres e participação nos lucros, por exemplo.
Força Sindical: É favorável. A Força acredita que isso dá mais força e aumenta o poder de negociação dos sindicatos.
CUT: É contra. A central é da opinião de que o acordado sobre o legislado vai atender mais aos interesses dos empresários do que dos trabalhadores. A CUT acredita que a CLT e, sobretudo, a Constituição, trouxeram vitórias ao trabalhador e discorda da tese de que há uma valorização da negociação coletiva. “Nem mesmo o que nós temos em lei está sendo implementado. Agora, colocando o que a gente negocia acima do que está na lei, nós vamos colocar a classe trabalhadora de joelhos em frente aos patrões”, afirmou a secretária de relações do trabalho da CUT, Graça Costa.
CNI: É favorável. Para a CNI, a negociação coletiva respeitará a lei existente, mas passará a ter mais força para flexibilizar itens diante das mais diversas realidades trabalhistas do país. “O Brasil é um dos únicos países do mundo que acatou patamar constitucional para direitos trabalhistas. Então a ideia é: respeitando aquilo que a lei diz, de que forma posso flexibilizar? A negociação coletiva permite que num Brasil tão distinto você estabeleça regras entre partes que respeitem essas realidades”, disse o presidente do conselho de relações do trabalho da CNI, Alexandre Furlan.
Parcelamento de férias
O que diz o projeto de lei: É permitida a divisão das férias em até três períodos, com a concordância do empregado. Um deles, no entanto, não pode ser inferior a 14 dias. Os outros dois restantes têm que ter mais de cinco dias corridos, cada. O texto veda ainda o início das férias no período de dois dias que antecede feriado ou dia de repouso semanal remunerado.
Força Sindical: Não vê problemas nesse artigo, desde que seja assegurado que o item é voluntário e a decisão fica a critério do empregado. A Força defende que essa permissão de divisão de férias tenha que ser autorizada por assembleia, para dar segurança na relação empregado/empregador. “Se o empregado negociar sozinho, pode ser pressionado a dividir e não vai recusar diante do receio da demissão”, disse o secretário-geral da Força, João Carlos Gonçalves, o Juruna.
CUT: É contra. A CUT entende que o empregado pode acabar sendo pressionao a dividir as férias a pedido do empregador. Além disso, acredita que há um prejuízo para a saúde do trabalhador. Com o fracionamento do descanso, o empregado fica mais sujeito a acidentes de trabalho.
CNI: É favorável. A CNI acredita que o parcelamento de férias é uma simples flexibilização de um direito e não há perdas para o trabalhador. Furlan lembra que a divisão das férias é uma possibilidade e tem que ter o aval do trabalhador, não pode ser imposta.
Demissão em comum acordo
O que diz o projeto: O contrato de trabalho poderá ser extinto por acordo entre empregado e empregador. Nesse caso, o patrão deverá pagar apenas metade da multa do FGTS (ou seja, 20%) e metade do aviso prévio. O trabalhador terá direito a sacar até 80% do FGTS.
Força: É contra porque acredita que o trabalhador poderá ser pressionado a entrar em um acordo para ser deligado da empresa. O presidente da Força e deputado, Paulo Pereira da Silva, afirmou que, se isso não for mudado no Senado, o presidente Michel Temer deveria vetar esse trecho. Ele acredita que haverá uma onda de demissões em acordo e um grande número de saques dos valores do FGTS. “Vai virar uma onda de demissão, uma coisa combinada. O trabalhador vai perder e gera uma conta pro estado, vai virar uma onda de saques do FGTS”, disse.
CUT: É contra porque também acredita que o trabalhador é o elo fraco e poderá ser pressionado a entrar em acordo para ser desligado da empresa abrindo mão de seus direitos.
CNI: É favorável. Para a CNI, o acordo atende os interesses dos dois lados e ocorrerá quando o trabalhador quiser ser efetivamente desligado. Isso acabaria, na opinião da confederação, com acordos fraudulentos que existem hoje para desligamento de trabalhadores. Furlan explica que, muitas vezes, o empregado pede para ser demitido e se propõe a devolver a indenização paga pela empresa.
Jornada intermitente
O que diz o projeto: regulamenta esse tipo de jornada, que não estava prevista na CLT. Esse contrato permite que o trabalhador receba por hora e possa trabalhar apenas alguns dias na semana ou por algumas horas diárias. Ele teria que ser convocado com cinco dias de antecedência.
Força: É contra porque acredita que isso vai precarizar a relação de trabalho, sem nenhuma garantia de direitos para o trabalhador, que ficará a mercê da necessidade do empregador.
CUT: É contra porque acredita que fracionar o contrato de trabalho retira direitos do trabalhador. Além disso, acredita que a existência de um contrato como esse vai precarizar o mercado de trabalho, uma vez que as empresas vão preferir esse tipo de regime, em que não tem que arcar com nenhum direito do funcionário, ao trabalho pro tempo indeterminado, com carteira assinada.
CNI: É favorável porque acredita que isso servirá para migrar trabalhadores da informalidade para o trabalho formal. “Vai proporcionar que um garçom que trabalha de segunda a sexta, possa ser chamado por um buffet no fim de semana e possa receber pelas horas que vai trabalhar. Vai possibilitar trabalhar em horas em que não tinha trabalho. Se o meu movimento é na quinta, sexta e sábado, porque teria garçons contratados na segunda, terça e quarta. Não ha supressão de direitos. Tem trabalhador informal que n tem direito a nada.
Fim do imposto sindical obrigatório
O que diz o projeto: Acaba com a obrigatoriedade do pagamento de um dia de salário por ano ao sindicato.
Força: É contra a forma como está no projeto. O deputado Paulo Pereira da Silva, o Paulinho da Força, chegou a apresentar um destaque ao projeto no plenário da Câmara para tentar transformar em gradual o fim da contribuição. Ele acha que é necessário um tempo para que os sindicatos se adequem.
CUT: É historicamente favorável ao fim da obrigatoriedade, mas não da forma como está no projeto. A secretária de relações do trabalho da CUT, Graça Costa, explica que tornar a contribuição opcional é uma bandeira da CUT há vários anos, mas acredita que isso teria que ser discutido no âmbito de uma reforma sindical, de forma que se negociasse outras formas de financiamento para os sindicatos. “A ideia que a CUT defende é de que os trabalhadores possam ir à assembleia, discutir e decidir se querem que seja feito o desconto, inclusive com discussão do valor dele. Da forma como está sendo feito é uma agressão porque você está tirando tudo. Tem que discutir como será o financiamento”, disse.
CNI: Não há posicionamento. A Indústria diverge sobre o assunto. Outras entidades patronais, como a que representa a Agricultura, por exemplo, já se posicionou de forma contrária ao fim da obrigatoriedade.
Intervalo intrajornada
O que diz o projeto: Empregados e empregadores poderão definir, por acordo coletivo, um horário menor de almoço. Hoje, ele é obrigatoriamente de uma hora. Pelo relatório, poderá ser menor, desde que se respeite o mínimo de 30 minutos para jornadas diárias maiores do que seis horas.
Força: É favorável. Segundo a Força, isso é uma demanda dos trabalhadores. Com um tempo menor de almoço, os trabalhadores conseguem distribuir melhor o banco de horas para que não precisem trabalhar no sábado.
CUT: É contra. A CUT acredita que há uma precarização do ponto de vista da saúde e segurança do trabalhador, que precisa de um período maior de descanso durante a jornada. De toda forma, a central acredita que, se esse item for à frente na reforma, é necessário que a empresa torne o tempo mais curto de almoço viável oferecendo um refeitório no local.
CNI: É favorável. A CNI defende que essa é uma demanda dos trabalhadores e reforça que não é uma obrigação, é uma opção, caso seja de interesse dos empregados.
Comitê representante dos trabalhadores
O que diz o projeto: Em empresas com mais de 200 funcionários deve haver um comitê que represente os trabalhadores. Esse comitê, contudo, não deverá ter relação com o sindicato.
Força: É contra porque acredita que isso diminui o poder do sindicato.
CUT: É contra e também acredita que isso diminui a força do sindicato. Para eles, não há como garantir que o representante vá mesmo defender o interesse dos trabalhadores e não do patrão.
CNI: É favorável. A confederação acredita que há um aprimoramento da relação da empresa com seu trabalhador, dentro daquele ambiente específico.
Fonte: Bárbara Nascimento/O Globo