O Estado brasileiro é raquítico”, afirma professor da Unicamp
SÃO PAULO - Toma posse hoje (15/08), às 16 horas, em cerimônia transmitida pela rede NBR e pela internet na página do IPEA, o novo presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, o professor Márcio Pochmann, da UNICAMP, e colaborador assíduo da Carta Maior.
Em entrevista à Carta Maior, o novo presidente do IPEA, Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, Márcio Pochmann, afirma que sua prioridade “é o Brasil, sua complexidade e sua diversidade”. Também afirma que o Estado brasileiro, ao contrário do que prega o conservadorismo da mídia e dos partidos à direita, “é raquítico” e não tem condição de gerir o país do jeito que está. Para ele, o único momento em que o Brasil, ao longo de sua história, revelou alguma pujança econômica e administrativa foi no ciclo que começou com a Revolução de 1930 e terminou em 1980. Nestes 50 anos o Brasil tornou-se um país moderno, com instituições modernas.
O IPEA é um órgão do governo federal, responsável pela coleta de dados em séries históricas, abrangendo dados macroeconômicos e regionais, balanço de pagamentos, câmbio, comércio exterior e interno, contas nacionais, emprego, estoque de capital, finanças, indicadores sociais, moeda e crédito, população, preços, salário e renda, transportes, entre outros. Algumas dessas séries recuam até 1940. As mais procuradas são as da série inflacionária, da balança comercial, da dívida interna e do setor público, e os índices gerais de preços. Segundo a página do órgão, hoje sediado na Secretaria de Planejamento de Longo Prazo (cujo ministro é o professor Mangabeira Unger), o objetivo do IPEA é descrever “o estado de uma nação”, isto é, o Brasil. A seguir, a entrevista do professor e nosso colaborador Márcio Pochmann.
CM – Três prioridades para o IPEA.
Márcio Pochmann – A primeira é o Brasil, sua complexidade, sua diversidade. A segunda é abrir um diálogo sobre o futuro...
CM – Na sua visão, isso quer dizer que o Brasil tem um futuro...
MP – Claro. Somos um país em construção. A terceira é a re-inserção do Brasil no mundo.
CM – Como assim?
MP – Na nova divisão internacional do trabalho o Brasil fica com a execução e não com a concepção.
CM – Um exemplo?
MP – Ao Brasil cabe a produção de produtos primários, de baixo valor agregado, com salários de padrão asiático.
CM – O que é um “padrão asiático de salários”?
MP – Valor baixo, longa jornada de trabalho, alta rotatividade.
CM – Seria o caso do etanol?
MP – O etanol vai se tornar a principal matriz energética do século XXI. Pode-se recolocar o Brasil no mundo, se isto impulsionar a agricultura familiar, a distribuição de renda. Ou se pode fazer de outro modo, o brasileiro tradicional, com 200 fazendas, 200 famílias, o país excludente de sempre, apenas agro-exportador. Como sempre.
CM – O Brasil está condenado a este modelo excludente?
MP – O Brasil só diferiu deste modelo entre 1930 e 1980. Nestes 50 anos o Brasil mudou sua inserção na economia mundial. Mudou seu padrão de produção, graças à industrialização. Deixou de ser uma grande fazenda para ser a 8ª economia do mundo. Estruturou uma sociedade moderna com base no assalariamento e na valorização do trabalho, ainda que tudo isto tenha seguido padrões muito longe de serem o ideal.
CM – Nesta acepção, o que é uma “sociedade moderna”?
MP – O Brasil constituiu instituições, sindicatos, organizando o interesse de trabalhadores e patrões. Construiu um Estado com capacidade de intervenção num país continental.
CM – Isso põe em tela o papel do Estado.
MP – O país tem um Estado raquítico. Apenas 8% da mão de obra ocupada pertence ao Estado. Nos Estados Unidos, são 18%. Na Europa, 25%. Na Escandinávia, 40%. Espanha e Portugal tem cerca de 20%.
CM – Que problemas isto acarreta?
MP – Um dos problemas do PAC é a capacidade de administração, de gestão. Faltam quadros para isso.
CM – O que fazer?
MP – Nossa proposta é discutir o desenvolvimento do país, não só o crescimento econômico. Isso implica discutir educação, saúde, serviços, ciência e tecnologia, cultura, só para começar.
CM – Muito obrigado, professor, parabéns e boa sorte.
MP – Muito obrigado.
Fonte: www.cartamaior.com.br – 15/08/2007