A Super-Receita Federal - Análise critica
A Receita Federal do Brasil, originada da MP 258 e mantida no Projeto de Lei 6272/05, conhecida pela alcunha de "Super-Receita", não pode ser analisada sem levar em conta dois grandes riscos à economia brasileira: a) o de aumentar ainda mais os gastos públicos e, conseqüentemente, a carga tributária; e b) e o de abusar das medidas fiscalistas. Há claras indicações de que com relação ao primeiro risco — o de aumentar os gastos públicos! — venha efetivamente a ocorrer.
O novo sistema envolve custos para a sua organização, administração e controle. Há previsões de que se venha a criar: a) cento e vinte novas Procuradorias-Seccionais da Fazenda Nacional; b) cinco Delegacias de Julgamento, c) sessenta turmas de julgamento e de se contratar mil e duzentos Procuradores da Fazenda Nacional, além do próprio secretário da nova organização. Baseadas nesses novos órgãos e contratações, as estimativas são de que haja aumento das despesas anuais ao redor de R$ 5 bilhões.
Com relação ao segundo risco — o do abuso fiscal! — também há indícios de que venha a ocorrer com mais intensidade. As próprias normas que orientam a nova Receita já vêm com medidas discriminatórias. Quem tiver, por exemplo, débito junto a Previdência e, por outro lado, crédito junto a Receita Federal, não poderá mais compensá-los: o governo outorgou à nova secretaria poderes para julgá-las, compensando os débitos e créditos ou não, podendo-se concluir que aquilo que era feito apenas pela força jurídica, não deverá ser feito pela administrativa.
As tendências fiscalistas preocupam os economistas adeptos da escola econômica austríaca. Não é para menos. De 1993 a 2005 os gastos públicos primários cresceram, nos três níveis de governo, 7,1 % a.a. em valores aritméticos médios reais, mais do dobro do crescimento do PIB, de apenas 2,9% a.a. no mesmo período.
Esse crescimento é responsável por recordes que nenhum País sensato gostaria de ter, como o de possuir a carga tributária: a) mais alta entre os países em desenvolvimento (hoje ela beira os 40% do PIB, mais do que o dobro da de muitos países da América Latina, como o Peru, de 15,2%; México, 18,5% e Chile, 19,2%, segundo dados do IBPT); b) mais regressiva e injusta do mundo (um pedinte ao comprar alimento ou remédio paga em tributos exatamente o mesmo valor monetário do que um milionário); e c) das mais perversas do mundo, justamente por ser regressiva, devido afetar drasticamente a produção, reduzir os salários e afetar fortemente os padrões de emprego, sem contar, também, que é a grande causadora dos altíssimos níveis de criminalidade do nosso País.
Preocupa, também, porque, inobstante ela já seja a mais perversa e regressiva do mundo, há uma clara tendência desses fatores nocivos crescerem mais ainda: a Super-Receita quer abandonar a arrecadação previdenciária sobre a folha em favor da sobre o faturamento. Esse procedimento fere os princípios da adequação tributária e da justiça econômica e social. Os preços e as quantidades exercem funções essenciais na economia. São parâmetros de ajuste da Oferta e da Demanda.
Quando o preço da mão de obra sobe, a quantidade desce, e vice-versa. As variações ou os níveis acentuados são sinais de que alguma coisa está errada e que precisa ser corrigida (não confundir com mascarada!). Os altos tributos sobre a folha reduzem, com certeza, a quantidade de mão de obra empregada. Mas essa queda não pode ser anulada por normas burocráticas. Transferir os tributos para outra ponta da cadeia produtiva (o faturamento empresarial!), não vai aumentar os empregos. Ao contrário, vai reduzi-los, via desordenamento dos preços relativos.
Está em jogo, nesse erro, o fato de alguns burocratas, com pouca intimidade econômica, acharem que os setores de ponta, portadores de alta tecnologia e que empregam, diretamente, pouca mão de obra, terem que contribuir mais com a formação de empregos diretos. Não sabem que esses setores empregam relativamente pouca mão de obra direta, mas muita mão de obra indireta. São setores que respondem por um alto percentual do PIB e da renda interna, respondendo, pari passu, por um alto percentual também de empregos na cadeia produtiva, não só nas grandes empresas como nas micros, pequenas e médias que vivem da grande.
A formação de empregos não para na empresa. Uma companhia telefônica, por exemplo, pode até empregar pouca mão de obra direta. O setor que ela pertence, entretanto, abriga muitas subdivisões industriais e uma extensa linha de produtos, serviços técnicos e logísticos, que vão das resinas de petróleo, aos micro chips, até chegar aos postos de venda dos aparelhos. Eles são responsáveis, no global, por muitos e muitos empregos, sem contar o efeito renda de todo esse arcabouço tecnológico que, ao criar renda e salários, gera poder de compra que vai ser gasto em toda sorte de bens e serviços.
A mudança da incidência tributária da folha para o faturamento além de penalizar a camada pobre da população pelos altos preços, vai, também, retirar os seus empregos pela queda da demanda e dos investimentos em um setor forte da economia nacional, suporte de negócios de muitos pequenos e micros empresários.
Não ignoramos, por fim, que a idéia da unificação da Receita Federal com a Previdência Social e sua centralização no Ministério da Fazenda visam fortalecer a Administração Tributária Nacional, garantir mais eficácia às licitações públicas, minimizar a corrupção e possibilitar, assim, avanços no equilíbrio orçamentário e previdenciário. Mas há dúvidas de que essa união alcance os resultados almejados.
Ao contrário, para alcançá-los o governo faria melhor se reduzisse drasticamente a burocracia e descentralizasse a administração e o controle das contas fiscais e previdenciárias, levando-os aos níveis municipais, mais perto da ocorrência dos seus fatos geradores, conforme fazem os sistemas verdadeiramente federalistas.
Artigo de Alfredo Marcolin Peringer - Publicado em 20.04.2007, em parceria com o Instituto Federalista.
Fonte: www.duplipensar.net