Mutirão apóia regularizações de rádios comunitárias em SP


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Mutirão de instituições públicas e entidades civis colabora para viabilizar processos de comunidades interessadas em explorar radiodifusão comunitária. Dificuldades encontradas reforçam necessidade de maior atenção ao setor. (Antonio Biondi – Carta Maior)

SÃO PAULO – Foi publicado no último dia 7 o aviso de habilitação para exploração do serviço de radiodifusão comunitária na capital paulista. É um fato inédito para o município, mais de oito anos depois da promulgação da lei federal que rege o funcionamento das rádios comunitárias no Brasil. Primeiro passo para a regularização das emissoras na cidade, o aviso levou à criação de um mutirão de instituições públicas e entidades civis para apoiar as associações comunitárias interessadas em obter a concessão para funcionamento de uma rádio.

Ao mesmo tempo, a publicação ao aviso lançou luz sobre uma série de problemas e dificuldades enfrentadas pelas rádios comunitárias, não só em São Paulo, mas em todo o Brasil. Entre elas, a morosidade e falta de estrutura do Ministério das Comunicações (Minicom) para atender os pedidos de entidades interessadas em colocar uma emissora no ar, a criminalização das rádios que funcionam sem o devido respaldo legal e, ainda, as dificuldades referentes à sustentação das emissoras.

Todos esses conflitos foram objeto de debates no último dia 8, quando foi realizada uma reunião de trabalho ligada ao tema na Assembléia Legislativa de São Paulo, reunindo representantes dos governos federal, estadual e municipal, bem como de diversas entidades da sociedade civil.

Um outro dado ressaltado durante a reunião foi o de que o atual prefeito de São Paulo e ex-deputado, Gilberto Kassab (PFL), teve aprovado no final de novembro em uma comissão da Câmara dos Deputados um projeto de lei (2.126/03) que cria novas exigências para a outorga e a prestação do serviço de radiodifusão comunitária no país. Caso aprovado pelo Congresso Nacional, o projeto promete criar dificuldades ainda maiores que as hoje enfrentadas pelas emissoras e causou preocupação. A reportagem de Carta Maior solicitou à assessoria de imprensa da Prefeitura esclarecimentos sobre a opinião que Kassab tem hoje de seu projeto de lei, bem como quanto à ausência na reunião de trabalho da Secretaria de Planejamento (Sempla), um dos principais órgãos da Prefeitura no que diz respeito à análise e autorização para o funcionamento das rádios comunitárias na cidade, mas não obteve as respostas até o fechamento da matéria.

Habilitação e mutirão
Presente à reunião realizada na Assembléia Legislativa, Eusébio Leonel Gonçalves, integrante da diretoria do Sinerc (Sindicato das Entidades Mantenedoras do Sistema de Radiodifusão Comunitária) destacou à Carta Maior que “esse é um primeiro passo, que já vinha sendo reivindicado e debatido pelas entidades da área há muitos anos”. Gonçalves estima que, no Estado de São Paulo, “temos 342 rádios funcionando direitinho, e na capital não havia saído sequer um aviso de habilitação, de forma que as rádios funcionam na clandestinidade, correndo riscos, sendo presas por agentes da polícia federal, etc”.

Renata Tibiriçá, da Defensoria Pública do Estado, defendeu na reunião na Alesp que o aviso “já foi publicado e o tempo já está contando, precisamos correr para resolver as coisas dentro do que foi colocado”. Responsável pelo setor de comunicação e assessoria de imprensa da Defensoria, Tibiriçá tem participado do mutirão de instituições públicas e entidades da sociedade civil voltado a orientar as entidades no processo de concessão da outorga para o serviço de radiodifusão comunitária.

A assessoria técnica e jurídica gratuita foi oferecida inicialmente nos dias 11 e 12, na própria defensoria (Av. da Liberdade, 32, próximo ao metrô Sé) e terá continuidade nos dias 18 e 19 (segunda e terça-feira), das 13h às 18h. Dez profissionais, entre advogados, técnicos e defensores públicos, farão gratuitamente o atendimento, que conta com a colaboração de entidades como o Escritório Modelo Dom Paulo Evaristo Arns (PUC-SP), Escritório Paulista da Amarc – Associação Mundial de Rádios Comunitárias e Cidadãs (OBORÉ), Anoreg-SP – Associação de Notários e Registradores do Estado de São Paulo (Associação dos Cartórios) e Centro de Estudos e Distribuição de Títulos e Documentos (CDT).

De acordo com Renata, cerca de quinze associações procuraram auxílio nos dois primeiros dias. “Está funcionando bem, nos 18 e 19 esperamos mais pessoas”. Ela explica que as entidades estão procurando tirar dúvidas a respeito da documentação que o Mincom exige, principalmente em relação ao estatuto da entidade, e também compreender quais os outros documentos que o aviso cobra (veja aqui as páginas
1 e 2 do aviso de habilitação). As entidades interessadas em participar do aviso deverão, por exemplo, adequar o estatuto da associação ao Novo Código Civil. As instituições envolvidas no mutirão disponibilizaram em suas páginas na internet modelos de estatuto para facilitar a tarefa das entidades, como o modelo preparado pela Anoreg-SP.

O prazo para envio dos documentos ao Departamento de Outorga de Serviços da Secretaria de Serviços de Comunicação Eletrônica do Minicom é de 45 dias, contados a partir do dia 7/12 – o prazo será encerrado em 22 de janeiro de 2007.

Ano que vem
Também presente à reunião de trabalho na Alesp no dia 8, Ricardo Campolim, da Abraço (Associação Brasileira de Radiodifusão Comunitária) fez questão de ressaltar que a publicação do aviso de habilitação não encerra os debates e problemas relacionados ao setor. Ele disse ser preciso registrar “que o aviso vem como resultado da luta dos companheiros e companheiras das rádios, que, durante esses anos todos, resistiram contra toda sorte de perseguição, criminalização e outros fatores contrários”. Campolim destacou que “estamos valorizando esse aviso, considerando ele um passo importante, mas queremos ir além, aproveitando a oportunidade”. Entre diversos pontos, o integrante da Abraço apresentou questionamentos à atual potência e raio de alcance estabelecidos na lei federal para o funcionamento das rádios, além de ter defendido a importância de se criar na capital um conselho de comunicação comunitária. “Precisa haver participação, democracia, envolvimento da base na construção desse processo”.

A representante do Ministério das Comunicações presente à reunião, Alexandra Costa, ressaltou a importância para o ministério do processo ora desenvolvido em São Paulo, algo que “aparece para o Brasil e para o mundo”. Segundo ela, “o modelo aqui trabalhado, de construção coletiva e interesse público deve ser replicado em outros locais, que estão inclusive nos procurando”. Para Alexandra, o processo do aviso de habilitação já está andando e deve ser priorizado, ao passo que a legislação federal precisa de mobilização da sociedade para mudar. Ao final, a representante do ministério assumiu o compromisso de seguir na articulação atual, para discutir temas como a criminalização das rádios e de seus responsáveis, a municipalização das concessões, a potência, raio e canal de transmissão das emissoras, o controle público na comunicação etc. Já no dia 15 de janeiro, haverá nova reunião do grupo de trabalho, para avaliar o processo e avaliar a necessidade de prorrogação do prazo referente ao aviso de habilitação.

Sem resposta
Para o deputado estadual Carlos Neder (PT-SP), “é fundamental o parlamento municipal e estadual participarem” da atual mobilização em apoio às rádios comunitárias na capital. Após pedir a palavra para ler o projeto de Gilberto Kassab aprovado pela Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática da Câmara, Neder afirmou que “o fato de termos avançado não significa que não teremos dificuldades. Sabemos que uma série de parlamentares foi eleita pelo lobby das grandes empresas de comunicação, interessados em barrar a democratização do setor”. Entre os mais de 90 projetos que tramitam na Câmara ligados às rádios comunitárias, Neder defendeu que é preciso acompanhar de perto o PL de Kassab, “agora o responsável por regulamentar as questões das rádios na capital”.

Na reunião de trabalho na Alesp, foi levantado, ainda, um questionamento a respeito de quando o Minicom vai divulgar o relatório do Grupo de Trabalho Interministerial sobre radiodifusão comunitária (GTI). O documento traz várias recomendações de mudanças na legislação e outros atos administrativos que podem aprimorar e fortalecer a atuação das emissoras comunitárias. Concluído no segundo semestre de 2005, o documento ainda não foi tornado público pelo Minicom, que também não o encaminhou oficialmente ao presidente Lula.

Outra questão levantada diz respeito à possibilidade de o ministério melhorar suas normas e procedimentos internos referentes à radiodifusão comunitária, que não dependem do Congresso Nacional e podem agilizar a tramitação dos processos de outorga do respectivo serviço. Segundo levantamento do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC), o governo federal possui hoje uma demanda de 13.595 pedidos de regularização de rádios no Ministério das Comunicações, demonstrando as dificuldades e os problemas para que as rádios possam ser regularizadas.

Fonte: www.cartamaior.com.br – 15/12/2006

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