Reforma administrativa avança com ameaças à estabilidade
Mais uma vez, a estabilidade dos servidores públicos federais volta a ser colocada na berlinda, agora sob a roupagem de uma “nova” reforma administrativa. No fim de maio, o presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB), criou um grupo de trabalho (GT) para discutir o tema. O problema é que o ponto de partida dessa discussão já está contaminado: o texto-base que servirá de guia para os debates foi elaborado em conjunto com entidades empresariais, como a Fiesp e a Cebrasse, sem qualquer participação de representantes dos trabalhadores ou mesmo do governo.
O texto, de autoria do deputado Zé Trovão (PL-SC), parece ter saído diretamente dos gabinetes do setor privado, propondo um “liberou geral” nas contratações temporárias, abrindo caminho para o desmonte progressivo do funcionalismo público.
Hoje, a Constituição determina que contratações temporárias só podem ocorrer em situações excepcionais. Ainda assim, esse tipo de vínculo vem sendo usado para baratear o serviço público, reduzindo salários e retirando direitos fundamentais como a estabilidade. Agora, a proposta em discussão quer constitucionalizar a precarização: pretende retirar a exigência do “excepcional interesse público” e criar uma lei nacional para normatizar esse modelo de contratação, o que, na prática, abre as portas para a terceirização e privatização ampla do serviço público.
O risco à estabilidade, pilar fundamental do serviço público de qualidade e imparcial, também aparece de forma clara nas entrelinhas do texto. Entre as propostas, está a possibilidade de perda do cargo por “insuficiência de desempenho”. Embora esse mecanismo já esteja previsto em lei e carece apenas de regulamentação, trazê-lo à tona num debate liderado por setores que constantemente atacam os direitos dos trabalhadores públicos não é coincidência. É uma tentativa de fragilizar o servidor, impor metas abusivas e ameaçar com demissões quem não seguir a cartilha da produtividade cega, desconsiderando as particularidades e a complexidade de muitas funções públicas.
Além disso, a ideia de atrelar remuneração exclusivamente à produtividade individual, permitindo contratações diretas em níveis superiores e alongando o tempo de progressão na carreira, visa desmontar a lógica de valorização dos servidores concursados. A meritocracia defendida pelos empresários que redigiram o texto não passa de um eufemismo para a retirada de direitos e a intensificação da pressão por resultados, ignorando o papel social do Estado e do servidor.
Não bastasse tudo isso, o momento em que esse debate é colocado na pauta chama atenção: em pleno ano pré-eleitoral, quando as instituições deveriam estar focadas na garantia da democracia e da estabilidade política, opta-se por desestabilizar justamente aqueles que seguram a ponta do serviço público nos momentos mais difíceis.
É preciso que os servidores federais, estaduais e municipais se mantenham em estado de alerta máximo. Não há ingenuidade nessa proposta. O objetivo é claro: desmontar o serviço público em favor dos interesses do setor privado, precarizar as relações de trabalho e enfraquecer o Estado como instrumento de justiça social. Cabe a nós resistir, denunciar e mobilizar. Porque defender a estabilidade é defender o Brasil.