Consultor político do Diap analisa efeitos negativos da PEC emergencial sobre os servidores públicos
O consultor político do Diap, Antônio Augusto de Queiroz, faz uma análise minuciosa sobre as consequências negativas da PEC Emergencial (Proposta de Emenda à Constituição nº 186/2019) sobre os servidores públicos e sobre a sociedade, em geral, a curto, médio e longo prazos.
Segundo o analista político, a PEC Emergencial foi elaborada para “dificultar ou impedir o Estado de expandir os gastos públicos com políticas sociais e com pessoal” e visa também aumentar os recursos para “pagamento de juros e encargos da dívida, mediante o emprego de gatilhos que congelam gastos essenciais e suspendem a expansão de novas políticas púbicas com reflexos sobre as finanças públicas”.
O gatilho pode ser acionado em três situações: a) na União, quando a relação entre despesa primária obrigatória e despesa primária geral alcançar 95% , e, nos Estados e Municípios, quando a despesa corrente atingir 95% das receitas correntes; b) quando for aprovada a lei complementar das finanças públicas sobre sustentabilidade da dívida, que prevê novas suspensões e vedações de gastos, e, independentemente da questão fiscal, c) quando for decretado estado de calamidade pelo Congresso Nacional.
No curtíssimo prazo, no caso de decretação de estado de calamidade, ficará facultado aos estados e municípios e será obrigatório e automático para a União o congelamento de todas as despesas públicas, conforme segue:
“I – Vedação da:
a) concessão, a qualquer título, de vantagem, aumento, reajuste ou adequação de remuneração de membros de Poder ou de órgão, de servidores e empregados públicos e militares, exceto dos derivados de sentença judicial transitada em julgado ou de determinação legal anterior ao início da aplicação das medidas de que trata este artigo;
b) criação de cargo, emprego ou função que implique aumento de despesa;
c) alteração de estrutura de carreira que implique aumento de despesa;
d) admissão ou contratação de pessoal, a qualquer título, com algumas poucas ressalvas;
e) realização de concurso público, exceto para as reposições de vacâncias previstas na alínea “d”;
f) criação ou majoração de auxílios, vantagens, bônus, abonos, verbas de representação ou benefícios de qualquer natureza, inclusive os de cunho indenizatório, em favor de membros de Poder, do Ministério Público ou da Defensoria Pública e de servidores, empregados públicos e militares, ou ainda de seus dependentes, exceto quando derivados de sentença judicial transitada em julgado ou de determinação legal anterior ao início da aplicação das medidas de que trata este artigo;
g) criação de despesa obrigatória;
h) adoção de medida que implique reajuste de despesa obrigatória acima da variação da inflação, observada a preservação do poder aquisitivo referida no inciso IV do caput do art. 7º;
i) criação ou expansão de programas e linhas de financiamento, bem como remissão, renegociação ou refinanciamento de dívidas que impliquem ampliação das despesas com subsídios e subvenções;
j) concessão ou ampliação de incentivo ou benefício de natureza tributária;
II – suspensão de progressão e de promoção funcional em carreira de agentes públicos, quando o respectivo interstício se encerrar no exercício financeiro mencionado no caput, excetuadas aquelas que implicarem provimento de cargo ou emprego anteriormente ocupado por outro agente”.
Para a sociedade, em geral, ficará proibida a criação de despesa obrigatória, o que impede a criação ou ampliação de novas políticas públicas sociais, exceto aquelas destinadas ao combate à pandemia.
No curto prazo, o consultor Augusto Queiroz destaca que essa hipótese dependerá de o Presidente da República requerer a decretação do estado de calamidade pública; e o Congresso Nacional aprovar o Decreto Legislativo.
No médio prazo, existem três hipóteses em que os gatilhos de congelamento e suspensão de ampliação do gasto com servidores poderão acontecer, sendo uma delas também extensiva aos demais assalariados. ´
A primeira decorrerá da regra do artigo 2º do Substitutivo à PEC 186, que dá nova redação ao art. 109 das Disposições Transitórias da Constituição Federal, segundo a qual sempre que a relação entre despesa primária obrigatória e despesa primária geral chegar a 95%, são automaticamente acionados gatilhos, por poder e órgãos, com vedações ou suspensões semelhantes às determinadas para os momentos de decretação de estado de calamidade pública.
No caso dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios o parâmetro para disparar os gatilhos é a relação entre receitas correntes e despesas correntes. Sempre que essa relação, apurada no período de doze meses, superar 95%, é facultado aos entes subnacionais acionarem os gatilhos com vedações e suspensões de despesas, sendo ainda facultado fazê-lo total ou parcialmente quando essa relação alcançar 85%, mas neste caso com exigência de que o legislativo – câmara de vereadores ou assembleia legislativa – decida sobre a suspensão ou manutenção dos atos que implementaram as vedações ou suspensões no prazo máximo de 180 dias.
A segunda está prevista no art. 4º do Substitutivo à PEC 186, que trata da redução de incentivos e benefícios federais de natureza tributária, e poderá atingir a todos os salariados. Esse dispositivo determina que o presidente da República, em até seis meses, encaminhará ao Congresso plano de redução gradual de incentivos e benefícios federais de natureza tributária, entre os quais se encontram as deduções no imposto de renda das despesas com saúde e educação e a isenção do imposto de renda de idosos e pessoas aposentadas por invalidez.
A terceira hipótese de contenção de gastos, inclusive com servidores, está no art. 1º do Substitutivo à PEC 186, que acrescenta o inciso VIII no art. 163 da Constituição, para autorizar que a lei complementar sobre finanças pública inclua dispositivos relacionados à sustentabilidade da dívida, prevendo medidas de ajuste, suspensões e vedações, incluindo aquelas vedações e suspensões previstas no art. 167-A do Substitutivo da PEC Emergencial.
No longo prazo, as medidas de contenção fiscal - especialmente:a) na Emenda à Constituição nº 95, do congelamento de gasto público; b) no Substitutivo da PEC 186 ( PEC emergencial); c) na PEC 32/2020, da reforma administrativa, e outras investidas sobre os servidores, os serviços públicos e as políticas públicas - trarão como consequência o aumento da miséria e da desigualdade no País, já que a proibição de ampliação da despesa com programas e políticas sociais prejudica principalmente os mais pobres e mais vulneráveis, que dependem da prestação do Estado.
CONGELAMENTO E REDUÇÃO DE SALÁRIOS
Antonio Queiroz explica que “A depender do comportamento das finanças públicas, podemos ter períodos prolongados, ou intercalados, de congelamento salarial e vedação de ingresso de servidores, não apenas reduzindo salários, na prática, pois não haverá, sequer, a reposição de perdas inflacionárias, e o sucateamento do serviço público, que poderá ser substituído por pessoal temporário e terceirizados, que não são computados como despesas com pessoal.”
Especialmente em relação aos servidores, o analista político faz questão de lembrar “que a reforma da previdência, instituída pela Emenda Constitucional nº 103, reservou duas maldades contra os servidores ativos, aposentados e pensionistas, que o governo pretende implementar após aprovar a PEC emergencial e a reforma administrativa. Trata-se da autorização para reduzir o limite de isenção da contribuição de aposentados e pensionistas para o regime próprio, do teto do INSS (atualmente de R$ 6.433,57) para o salário mínimo (atualmente de RS 1.045,00), e da instituição de contribuição extraordinária para o regime próprio, a ser cobrada de servidores ativos, aposentados e pensionistas, com redução nos dois casos nos proventos dos aposentados e pensionista e no segundo caso dos salários dos servidores ativos.”
O autor destaca também que “a sociedade, em geral, especialmente os mais pobres, serão prejudicados com menos serviços públicos e menos participação no orçamento, e os servidores, escolhidos como a variável do ajuste, pagarão a conta com suspensão de reajuste salarial, com congelamento de progressão e promoção e com o aumento de contribuição para o regime própria de previdência, além do já implementado aumento de alíquotas previdenciárias.
E finaliza: “O mais bizarro é que a equipe econômica do governo, liderado pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, ainda queria incluir um dispositivo na PEC emergencial para permitir redução de salário com redução de jornada do servidor. Resta saber quanto tempo levará para que essa ideia nefasta seja colocada novamente na pauta do Governo.”
O autor, Antônio Augusto de Queiroz é jornalista, analista e consultor político, mestrando em Políticas Públicas e Governo pela FGV, diretor de Documentação licenciado do Diap, e Sócio-Diretor das empresas Queiroz Assessoria em Relações Institucionais e Governo e Diálogo Institucional Assessoria e Análise de Políticas Públicas.
Fonte: Agência DIAP – www.diap.org.br - Março/2021